ePol está substituindo plataformas de armazenamento e organização de dados para se constituir como uma grande biblioteca virtual do trabalho de polícia judiciária.
A necessidade de informatização de inquéritos policiais e demais dados e automação de tarefas fez com que a Polícia Federal colocasse em prática o Sistema de Polícia Judiciária (ePol), hoje, sob a coordenação da Corregedoria-geral da PF (Coger) e sustentação da Diretoria de Tecnologia da Informação e Inovação (DTI).
Com um investimento de mais de R$ 100 milhões nos últimos dois anos para a implantação da ferramenta, a PF tem trilhado um longo caminho, desde 2010, para implantar o sistema do zero, a começar pela mudança na cultura interna dos servidores, orientados a se adaptar a uma nova plataforma colocada em operação, mesmo em fase de desenvolvimento.
“Não era e não é viável contratar uma empresa de tecnologia para desenvolver o ePol e nos entregar pronto, porque ela não conhece o fluxo do trabalho policial e os processos que precisamos seguir internamente. Ela não saberia quais são as nossas necessidades de automação de tarefas e necessidades de inovação tecnológica. E a única forma de identificar, não só os gargalos, como essas necessidades é colocando o sistema para funcionar”, diz o corregedor-geral da PF, delegado federal João Vianey.
O ePol está substituindo outras plataformas de armazenamento e organização de dados e promete centralizar as investigações criminais, desburocratizar o inquérito policial e se constituir como um centro de informação – ou uma biblioteca virtual – com dados estatísticos de todo o trabalho policial, de Norte a Sul do Brasil.
A migração dos inquéritos físicos para o novo sistema vem ocorrendo de forma gradativa, nas unidades de todo o País. Até outubro, o ePol já comportava 75% dos inquéritos policiais em andamento, tanto instalados originariamente, quanto migrado do Siscart (Sistema de Controle de Atividades Cartorárias). Ou seja, dos 88.275 inquéritos policiais em andamento, 69.824 já estão no ePol e 18.451 no Siscart.
Inquérito digital
João Vianey lembra de uma série de iniciativas isoladas de vários colegas na tentativa de contribuir com a evolução tecnológica do trabalho policial. O próprio Siscart que hoje está sendo substituído pelo ePol foi uma dessas iniciativas. Apesar de ter sido adotado nacionalmente e assumido pela DTI, a sua aplicação em âmbito nacional de forma a atender às necessidades de inovação tecnológica do trabalho policial, carece de efetividade, segundo o corregedor-geral da PF.
“Se nós tivéssemos que usar o Siscart de maneira nacional ele teria que ser ‘redesenvolvido’ e é o que estamos fazendo. Estamos ‘redesenvolvendo’ o sistema de polícia judiciária com o ePol. Basicamente a gente está adaptando o que é o Siscart, que são as regras de negócio de um sistema de polícia judiciária, para o âmbito nacional”, diz Vianey.
Desafios
De acordo com o diretor de Tecnologia da Informação e Inovação da PF, delegado federal William Murad, o desenvolvimento de um sistema do zero é multidimensional, tem muitas interações, muitos elementos que precisam estar alinhados de forma sinérgica para que o projeto evolua.
“O desafio é enorme. Existem dois pontos para superá-lo. O principal é a estabilidade do sistema. Precisamos dela para continuar o projeto para que os usuários tenham um sistema minimamente estável para poder trabalhar nas pontas. O segundo é a necessidade de evolução desse sistema”, explica Murad.
Segundo o delegado federal, existe uma lista grande de mudanças que precisam ser implementadas. Mas, pela necessidade de estabilização, esse processo evolutivo acaba travando. “Toda vez que evoluímos o sistema, quando inserimos uma funcionalidade nova, isso necessariamente traz um reflexo para a estabilidade. Estamos com esse dilema”, afirma.
Para atravessar essa fase, o diretor de Tecnologia da Informação e Inovação da PF disse que existe um plano cuidadosamente elaborado e que já está em curso com o acompanhamento diário de técnicos, arquitetos de sistemas, engenheiros de software, tanto da DTI, quanto de empresas privadas e de consultorias, para que seja feita essa estabilização.
Confira a seguir algumas dúvidas de usuários do ePol respondidas pela Coger e DTI em conversa com a ADPF:
É possível trabalhar com o ePol offline? Ou não perder o trabalho quando a internet cair?
Hoje, não é possível. Mas é uma necessidade que já foi identificada e que há um trabalho de arquitetura para que isso seja permitido. É uma das prioridades, mas compete com a necessidade de primeiro estabilizar o sistema, para depois fazer essas evoluções. Já fizemos tentativas e ajustes. Mas justamente por conta de dificuldades de link e no desenvolvimento da solução, acabou dando mais problema do que nos auxiliando. Mas em algum momento vamos, sim, trabalhar para que ele funcione offline. É um desafio coletivo, tanto de arquitetura e programação, quanto de infraestrutura.
Quando será possível que os estagiários possam operar no ePol?
O ePol, como ele é corporativo, depende de uma série de regras de negócios dos nossos sistemas relacionados, até mesmo, à área de gestão de pessoal. Então, dependemos de alguns ajustes na arquitetura dos sistemas da DGP [Diretoria de Gestão de Pessoal] para que os estagiários consigam entrar no ePol.
É possível assinar os termos biometricamente?
Isso também foi levado em consideração lá no início, de tentarmos usar o padrão biométrico para assinatura. Mas há uma complexidade de implantação que envolve questões de não identificação criminal do indivíduo.
Existe a pretensão do ePol aceitar arquivos de áudio e vídeo?
Isto passa por questões de velocidade de conexão. Se a gente for ocupar os nossos links que já são bem congestionados, com upload de áudio ou vídeo de arquivos de grande volume, como oitivas gravadas, isso vai gerar um problema não necessariamente para o ePol, mas para todo o sistema que a PF precisa utilizar. Estamos constituindo um grupo para estudar um modelo de arquitetura de infraestrutura regionalizado e distribuído para lidar com isso. Mas não é um projeto de curto prazo porque é de âmbito nacional, as realidades são muito distintas.
Por que no horário de expediente, o ePol fica mais pesado? Tem a ver com o número de usuários?
Está, sim, relacionado com a quantidade de usuários que acessam o sistema e que acessam a rede, mas também há múltiplas causas. Nosso desafio com a estabilização inclui fazer com que o sistema tenha uma boa performance e seja otimizado, mesmo com um número de usuários elevado que a gente sabe que vai ter.
Há alguma estratégia para aumentar a disponibilidade de rede, principalmente, em lugares mais distantes?
Fizemos uma contratação, em 2019, de novos links de rede para todo o País – são mais de 400 pontos interconectados. Em paralelo, investimos para acelerar e otimizar o tráfego dessa rede. Com esses dois investimentos achávamos que o tráfego iria diminuir bastante. No entanto, aumentou demais o consumo. Então, fizemos um subdimensionamento, ainda temos condições de expandir, mas não da forma como gostaríamos. Por isso, já iniciamos um novo contrato que é prioritário para sair já no primeiro semestre de 2021 que revê todos os links em âmbito nacional. Estamos correndo com isso para que tenhamos maior disponibilidade. Além disso, estamos redesenhando a arquitetura da rede para melhorar nossa disponibilidade.
Há alguma diferenciação de disponibilidade de rede de um local para o outro? Ou seja, alguma localidade é mais privilegiada que a outra?
Por razões óbvias Brasília concentra toda a infraestrutura de TI da Polícia Federal, aqui é o órgão central. É óbvio que nós temos uma estrutura de rede diferenciada justamente para fazer tudo isso funcionar. Mas, não é verdade que as pontas são esquecidas. Quando a gente faz uma contratação, é dimensionada a necessidade local. E esse dimensionamento é técnico, verificamos qual a média de consumo deste local. Até porque, há dois anos, o custo dos links que garantem uma velocidade constante de download e upload, era muito alto. Mas esse custo caiu. A ideia é que a gente faça uma contratação muito ampla e que seja paga de acordo com o consumo.
A contratação de nuvem está descartada ou é uma possibilidade?
Temos contratações de nuvem em andamento na DTI. A ideia é que a gente monte uma estrutura conhecida como Multicloud que é a contratação de diversos provedores de nuvem. Há uma discussão de um problema importante que é relacionado à segurança, então existe um desenho arquitetônico a ser feito para proteger os nossos dados. A nuvem é uma realidade dentro dos nossos planos. O que temos que chamar a atenção é que o ePol não roda na nuvem, ele roda dentro de uma estrutura própria da DTI que são servidores. Mas, pode ser que em algum momento o ePol tenha módulos que possam consumir algum recurso de nuvem.
É possível a contratação de algum software para ser implementado dentro do ePol ou tudo será feito dentro da DTI?
Nós temos muitos recursos contratados. Não temos uma decisão única de se desenvolver tudo na DTI. No caso da unificação do sistema de investigação, a ideia é que seja criado um portal com muitas ferramentas investigativas. Algumas dessas ferramentas são desenvolvidas aqui, outras são adquiridas, outras podem ser incorporadas de outro órgão. E essa é uma tendência de ter uma arquitetura de desenvolvimento de sistemas que sejam acopladas novas funcionalidades, novas tecnologias.